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"Tal como surgiu diante dos meus olhos, a esta hora meridiana, fez-me a impressão de uma alegre oficina da sabedoria." (Umberto Eco, O Nome da Rosa)
Ernesto Blanco
A desistência de ler, numa época de poderosos recursos audiovisuais, dá-se, em muito boa parte, à conta de ser a leitura vivida como um processo abstrato, quase invisível, que para se tornar operativo exige um esforço sem exteriorização. Neste infeliz contexto em que todas as coisas tratam de garantir uma imagem, ler silenciosamente torna-se uma tarefa de Sísifo, um esforço sempre em risco de perder de vista a sequência verbal donde brotam as histórias. De histórias todos gostam, mas o facto é que, para muitos que desistem de ler, o poder das histórias que conhecem por perceção sensorial direta se sobrepõe ao das que nascem do processo da leitura, mais abstrato e mais difícil. A experiência pontual de ler e ouvir ler em voz alta pode fornecer novas energias a esse Sísifo desistente em que, muitas vezes, se torna o leitor. Depois de termos ouvido realmente o som dos textos, poderemos ouvir melhor, dentro de nós, em silêncio, os animados diálogos que as longas séries de palavras separadas por espaços em branco vão projetando a partir do movimento oculto da leitura silenciosa. Trata-se de uma experiência em que as palavras, por onde correm as figuras e as histórias, se concretizam na boca e nos ouvidos. Ouvir-se e ouvir a ler em voz alta acompanha a história que se vai desenhando na nossa mente de uma banda sonora que lhe reforça o poder comunicativo. A leitura em voz alta torna o leitor/auditor e o auditor/leitor mais sensíveis aos mecanismos que permitem o trânsito de histórias pelas palavras e mais conscientes de que aqueles entes que têm som e passam das bocas de uns para os ouvidos de outros vão permanecer como imagem e memória.
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