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scriptorium

"Tal como surgiu diante dos meus olhos, a esta hora meridiana, fez-me a impressão de uma alegre oficina da sabedoria." (Umberto Eco, O Nome da Rosa)



Sábado, 08.03.14

HISTÓRIAS ACERCA DE UMA HISTÓRIA

Porque escrevi eu esta história? Houve várias razões. Uma — a minha preocupação com a falta de cuidado com que, muitas vezes, se escreve e fala a língua portuguesa. Levou-me, esta preocupação, a pensar nas palavras, nas frases, coitadas, a verem-se desfiguradas e a sentirem-se como quando nos trocam o nome e não gostamos mesmo nada, ficamos zangados. Então, inventei uma revolta, uma revolta de frases em luta pela correção da escrita da nossa língua. Outra — a minha vontade de que uma história cheia de impossíveis se passasse numa escola. Porque é que as histórias de encantar hão de sempre passar-se em florestas, castelos, em mundos de fantasia? Como e onde se iria passar a revolta destas frases? Porque não numa escola? Pensei que a escola, para além de ser um lugar onde se sucedem aulas e outras coisas afins, poderia ser, pode ser, um lugar habitado pelo fantástico. Porque é que uma história onde acontecem coisas impossíveis não se há de passar numa escola, com personagens que são professores, alunos, o diretor, funcionários? Porque é que um sítio que faz parte da nossa vida de todos os dias, não pode tornar-se no lugar em que acontecem projeções mágicas, em que misteriosas frases falam em público ou desaparecem inexplicavelmente, em que um diretor conversa amigavelmente com uma frase que sente, pensa, gesticula? Uma frase vermelha. Porque é que D. frase é vermelha? Porque o vermelho é uma bela cor que sobressai nas paredes e nos tampos das mesas escolares? Porque o vermelho é a cor da revolta? Porque D. frase — Deixem-me em paz! está irritada com a situação e, quando nos irritamos, ficamos corados? A verdade é que, nisto, não pensei antes de escrever esta história.

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por Maria Almira Soares às 20:38

Sábado, 08.03.14

O GÉNIO DO ENSINO

 

Imagino que me aparece o Génio do Ensino e, como é da tradição dos génios, me propõe formular três desejos. E que, sem hesitar, eu aproveito para dar voz a três graves urgências e não demoro a responder. Em primeiro lugar, respondo que é absolutamente urgente: — que a nossa literatura clássica regresse em força aos programas de português; que a sua presença, agora tímida e residual, deixe de ocupar um lugar distributivo, mas passe a ser central nesses programas; que se desqualifiquem os falsos argumentos que a têm retirado e que se qualifique a experiência demonstrativa de que quem sabe ler Os Lusíadas ou os Sermões de Vieira sabe servir-se dos textos do quotidiano, enquanto o contrário não é verdadeiro; que a determinação das leituras programáticas não seja consequência de uma visão precária, pessoal ou grupal, mas fruto de um pensamento estruturado sobre desígnios fundamentados; que se encarem, lá onde elas residem, as aduzidas dificuldades na leitura dos grandes, belos e indiscutíveis textos, em vez de os transformar na causa perversa do miserabilismo literário dos programas; que a programação do ensino do português seja fonte de enriquecimento cultural e não consequência de administrativismos. Logo a seguir, respondo que é absolutamente urgente: — «refazer» os professores de português com profundos e alargados saberes e experiências, nomeadamente a da leitura; configurar e atestar a sua identidade profissional em contextos de formação credíveis e exigentes; «construir», na pessoa que se sente capaz, preparada para ser professor de português, uma persona profissional criadora de valor cultural; destruir o alisamento do professor como funcionário, investindo séria e persistentemente num quadro de formação que faça dele uma autoridade. Finalmente, respondo que é urgente: — que a ocasional novidade do ensino de uma nova ortografia seja uma oportunidade para dar atenção à grafia das palavras, habitualmente pouco valorizada; que a mudança ortográfica proporcione uma rigorosa e honesta atenção à etimologia, que tanta curiosidade desperta; que a língua seja vista como um bem comum e não como um objeto que usamos e estafamos como se pertencesse só a cada um. Quanto ao poder de um Génio para concretizar estes três desejos… fico a pensar que o engenho é necessário, sim, mas tem de ser temperado com muito estudo.   

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por Maria Almira Soares às 20:28


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