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scriptorium

"Tal como surgiu diante dos meus olhos, a esta hora meridiana, fez-me a impressão de uma alegre oficina da sabedoria." (Umberto Eco, O Nome da Rosa)



Sexta-feira, 21.03.14

FILHAS DE ZEUS E DA MEMÓRIA

 

 

 

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por Maria Almira Soares às 18:58

Sexta-feira, 21.03.14

COMEÇANDO...

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por Maria Almira Soares às 18:43

Sexta-feira, 21.03.14

LEMBRANDO LEITURAS...

 

 

 

OUVE, POETA ROMÂNTICO:

 

Como queres que compreenda a tua dor de incompreendido

Se nunca deitei fogo aos problemas

Para fugir da terra

Num cavalo de asas de fumo?

Nem nunca pairei sobre os homens

De ouvidos tapados

Para ouvir melhor dentro de mim

As lágrimas das sereias

A insinuarem-me ilhas pessoais

Nos berços aéreos das manhãs de sal?

Como queres que entenda o teu desamparo de herói caído

Se nunca andei pelo céu

Com pés de estrelas…

Nem nunca desci à terra como tu

Para completar a paisagem com os olhos…

Ou dar aos escravos

— a pobre carne-de-viver dos escravos!

—A glória de comungar de joelhos

A aristocracia da minha dor

Do tamanho de uma cidade forrada de pele humana

Com ruas calcetadas de olhos tristes?

Não poeta romântico.

Cairia morto de vergonha

Se vagueasse pelo mundo

A enxugar lágrimas de pobres

Com lenços de nuvens.

E desceria à fundura Da raiz mais oculta dos frios

Se não fosse igual a todos

Menos a mim mesmo.

E cegar-me-ia com unhas

Até ao silêncio das imagens

Se passasse como tu os dias e as noites

A mirar-me ao espelho

Para ver o meu esqueleto genial

Dependurado com flores

Entre a terra e o céu

Num balouçar de deus

Que não se resigna às pedras nem às nuvens… 

Enquanto no inferno da vida

Os outros esqueletos

Atiram pazadas de carvão

Para as fornalhas das máquinas

Que fabricam o fumo

Onde os poetas desenham quimeras de desdém.

Não, poeta romântico.

Eu nasci para cumprir outro destino mais novo.

Ser homem apenas sem sangue excepcional

A arder no desejo absurdo

De andar pelas ruas

Vestido de vidro

Para que todos possam ver na minha alma

A dor comum finalmente revelada!

E os sonhos de todos com terra!

E a fome sem estrelas!

E a cólera sem travões!

E a morte sem anjos!

E a revolta sem bandeiras!

E o sol com sol!

Não poeta romântico.

Como queres que compreenda a tua dor de incompreendido

Se só entendo os homens

Quando choram lágrima de terra?

(E nem me entendo a mim?)

 

José Gomes Ferreira

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por Maria Almira Soares às 13:50

Sexta-feira, 21.03.14

LEMBRANDO LEITURAS...

 

PORTUGAL
Ó Portugal, se fosses só três sílabas,
linda vista para o mar,
Minho verde, Algarve de cal,
jerico rapando o espinhaço da terra,
surdo e miudinho,
moinho a braços com um vento
testarudo, mas embolado e, afinal, amigo,
se fosses só o sal, o sol, o sul,
o ladino pardal,
o manso boi coloquial,
a rechinante sardinha,
a desancada varina,
o plumitivo ladrilhado de lindos adjectivos,
a muda queixa amendoada
duns olhos pestanítidos,
se fosses só a cegarrega do estio, dos estilos,
o ferrugento cão asmático das praias,
o grilo engaiolado, a grila no lábio,
o calendário na parede, o emblema na lapela,
ó Portugal, se fosses só três sílabas
de plástico, que era mais barato!


Doceiras de Amarante, barristas de Barcelos,
rendeiras de Viana, toureiros da Golegã,
não há “papo-de-anjo” que seja o meu derriço,
galo que cante a cores na minha prateleira,
alvura arrendada para o meu devaneio,
bandarilha que possa enfeitar-me o cachaço.

Portugal: questão que eu tenho comigo mesmo,
golpe até ao osso, fome sem entretém,
perdigueiro marrado e sem narizes, sem perdizes,
rocim engraxado,
feira cabisbaixa,
meu remorso,
meu remorso de todos nós . . .

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por Maria Almira Soares às 13:00


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