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"Tal como surgiu diante dos meus olhos, a esta hora meridiana, fez-me a impressão de uma alegre oficina da sabedoria." (Umberto Eco, O Nome da Rosa)
Pregava Santo António em Itália na cidade de Arimino, contra os hereges, que nela eram muitos; e como erros de entendimento são dificultosos de arrancar, não só não fazia fruto o santo, mas chegou o povo a se levantar contra ele e faltou pouco para que lhe não tirassem a vida. Que faria neste caso o ânimo generoso do grande António? Sacudiria o pó dos sapatos, como Cristo aconselha em outro lugar? Mas António com os pés descalços não podia fazer esta protestação; e uns pés a que se não pegou nada da terra não tinham que sacudir. Que faria logo? Retirar-se-ia? Calar-se-ia? Dissimularia? Daria tempo ao tempo? Isso ensinaria porventura a prudência ou a covardia humana; mas o zelo da glória divina, que ardia naquele peito, não se rendeu a semelhantes partidos. Pois que fez? Mudou somente o púlpito e o auditório, mas não desistiu da doutrina. Deixa as praças, vai-se às praias; deixa a terra, vai-se ao mar, e começa a dizer a altas vozes: Já que me não querem ouvir os homens, ouçam-me os peixes. Oh maravilhas do Altíssimo! Oh poderes do que criou o mar e a terra! Começam a ferver as ondas, começam a concorrer os peixes, os grandes, os maiores, os pequenos, e postos todos por sua ordem com as cabeças de fora da água, António pregava e eles ouviam.
António Vieira
Vergílio Ferreira vê, na inexistência de uma conjugação natural com uma profissão não procurada a partir de si, mas induzida por circunstâncias de vária ordem, a oportunidade de construir a sua persona professoral, desligada de qualquer adesão afectiva e muito determinada pelas suas convicções ideológicas, existenciais, estéticas. Não gosta de ser professor; torna-se professor como parte de um processo de paulatina inculcação da tendência escolarizadora da sua vida. Ser professor apresenta-se-lhe como conveniente ocupação do lugar, em si disponível, para uma profissão. Não nasceu professor, aceitou-se e construiu-se professor. E talvez o tenha feito com tal perfeição que chegou até a fazer-se perceptível como um professor que gosta de ser professor. Daí a necessidade de constantemente lembrar que «não, não gosta mesmo». Esta negação do gosto é fulcral, porque fundadora do vazio sobre o qual se constroem todas as opções identitárias do professor Vergílio Ferreira.
Não quero ser um vil moinho de ensinar.
Perante a necessidade de construir uma identidade docente, não escolhe identificar-se com as versões institucionais do ser-professor que, com alguma variação, vão sendo contemporâneas do seu devir profissional. Não enquadra o seu exercício da profissão nos limites do cumprimento dos mínimos obrigatórios determinados pela dimensão institucional, nem transforma esse cumprimento em medida de realização profissional. Não é um burocrata do ensino. Pelo contrário.
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