Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]

scriptorium

"Tal como surgiu diante dos meus olhos, a esta hora meridiana, fez-me a impressão de uma alegre oficina da sabedoria." (Umberto Eco, O Nome da Rosa)



Quinta-feira, 31.07.14

LIVRO VIVO

30 Things Librarians Love

Autoria e outros dados (tags, etc)

por Maria Almira Soares às 18:13

Quinta-feira, 31.07.14

SERVIÇO ESCOLAR

 

Assim se desarticulou a aliança nuclear professor/aluno, como lugar singular da educação escolar. Outros termos, distensores do ponto de equilíbrio entre centro e periferias da escola, passaram a ter um lugar privilegiado no discurso e nas práticas da educação escolar. Entidades várias, de ordem social e ambiental, sobrepõem-se à singularidade da relação entre uma criança ou um jovem e um professor. Destituiu-se a relação: «esse imprevisível da relação pelo qual algo não é idêntico, mas eterno […] isso que define uma relação, o não estar determinada de fora, mas valer como tal, na sua complexidade», nas palavras de Silvina Rodrigues Lopes em Literatura, Defesa do Atrito. Subtrai-se da relação professor/aluno a potencialidade do seu carácter imprevisível e o seu horizonte de transcendência, dando-lhe um carácter finito de prestação social, cujos parâmetros passam a ser os de um serviço e cuja utopia é a da representação positiva daqueles a quem serve: a educação escolar procura a satisfação dos seus clientes

Autoria e outros dados (tags, etc)

por Maria Almira Soares às 15:59

Quinta-feira, 31.07.14

O CÁGADO

 

 Ilustração de Maria Portela

 

«Havia um homem que era muito senhor da sua vontade. Andava às vezes sozinho pelas estradas a passear. Por uma dessas vezes viu no meio da estrada um animal que parecia não vir a propósito — um cágado. O homem era muito senhor da sua vontade, nunca tinha visto um cágado; contudo, agora estava a acreditar. Acercou-se mais e viu com os olhos da cara que aquilo era, na verdade, o tal cágado da zoologia. O homem que era muito senhor da sua vontade ficou radiante, já tinha novidades para contar ao almoço, e deitou a correr para casa. A meio caminho pensou que a família era capaz de não aceitar a novidade por não trazer o cágado com ele, e parou de repente. Como era muito senhor da sua vontade, não poderia suportar que a família imaginasse que aquilo do cágado era história dele, e voltou atrás. 0uando chegou perto do tal sítio, o cágado, que já tinha desconfiado da primeira vez, enfiou buraco abaixo como quem não quer a coisa. O homem que era muito senhor da sua vontade pôs-se a espreitar para dentro e depois de muito espreitar não conseguiu ver senão o que se pode ver para dentro dos buracos, isto é, muito escuro. Do cágado, nada. Meteu a mão com cautela e nada; a seguir até ao cotovelo e nada; por fim o braço todo e nada. Tinham sido experimentadas todas as cautelas e os recursos naturais de que um homem dispõe até ao comprimento do braço e nada. Então foi buscar auxílio a uma vara compridíssima, que nem é habitual em varas haver assim tão compridas, enfiou-a pelo buraco abaixo, mas o cágado morava ainda muito mais lá para o fundo. Quando largou a vara, ela foi por ali abaixo, exatamente como uma vara perdida.» [...]

 

Almada Negreiros

Autoria e outros dados (tags, etc)

por Maria Almira Soares às 14:33

Quarta-feira, 30.07.14

UM PROFESSOR

«Mas o que mais me excitava eram as conversas à margem dos textos, dos assuntos de literatura […] Os alunos abriam os olhos, fascinados, e eu sentia que eles transpunham o limiar da aparição. […] Falei aos moços de Proust, do tempo reencontrado nas lembranças, do halo que se ergue de um sabor que se conheceu na infância, das pervincas azuis de Rousseau, reencontradas mais tarde com a memória de outrora. […] Naturalmente, poucos moços me entenderam. Mas o seu olhar aberto de espanto, a sua imobilidade em face da anunciação eram o sinal de que algo longínquo lhes acenava infinitamente.»

 

Vergílio Ferreira, Aparição



 

Autoria e outros dados (tags, etc)

por Maria Almira Soares às 13:33

Terça-feira, 29.07.14

AUTORRETRATO

 

 

Tudo o que floresce tem uma raiz, acredito. E uma flor, eu sei, houve na minha vida de professora: a da alegria de ensinar.

A raiz, portanto.

Tudo começou nos anos cinquenta do século passado, numa escola que tinha como patrono um santo, a Escola de São Miguel: este meu retrato de professora começa nos meus primeiros passos de aluna.

Em Ovar, num mês de outono, eu, quase a fazer sete anos, tive, pela primeira vez, uma aula. E essa foi a primeira palavra mágica: aula! A experiência inaugural do seu sentido soube-me bem, numa idade em que o significado do verbo saber estava  ainda muito mais preso ao sabor do que ao conhecimento. Era numa sala ampla e fresca, arejada, em que as madeiras, gastas por muitos anos de uso, tinham uma textura acetinada. Havia cheiro de giz, de lousa, de papel de livros e cadernos, de lápis afiados, de tinta vazada com jeito e precisão nos tinteirinhos de esmalte branco encaixados no recorte redondinho da madeira. Quase tão bom como o perfume das brincadeiras a que a escola viera roubar tempo! Os primeiros momentos de escola foram de alegria. Mas só a alegria não chega. Alguma coisa mais sólida me segredou o desejo de vir a ser professora, enquanto assistia, ali de tão pertinho, ao modo como a D. Albertina sabia passar um saber de si para os outros! Foi isso: a vontade de ser alguém com um saber dentro de mim e completamente disposta a passá-lo para outros que, a partir daí, poderiam também dizer eu sei, eu já sei, eu já sei ler... Lembro-me de que, aos olhos da criança que então era, isto representou uma espécie de autoridade, de superioridade, que eu queria ter. Queria poder dizer está certo ou está errado, transformar o errado em certo. Coisa tão forte, que até se transformou em brincadeira. Passei a brincar ao ser professora!

Mas todas as histórias são feitas de uma sucessão de depois. E, depois, o cenário mudou. Drasticamente. Nesse tempo em que muita coisa estava errada, a que a muito poucos era possível continuar na escola, em que havia tão poucas escolas, fui obrigada a sair do mundo encantatório de uma infância quase-rural, a caminho da cidade. Não havia Liceu (era esse o nome) em Ovar e, daí, a mudança quase traumática para o que, aos meus olhos pequeninos, era a cidade grande: o Porto. Migrámos todos, a família toda. Só a alegria foi a mais demorada a fazer a viagem. A escola já não tinha nome de santo, mas de... académica! Passou a ser uma sucessão interminável de corredores e portas e gente, onde eu quase me perdia... O tempo e o espaço tinham radicalmente mudado. Era o Liceu Nacional de Carolina Michaëlis. Imaginem a diferença! Ironicamente, foi nessa diferença que veio a acontecer o reencontro, mais à frente, com a alegria de saber, de compreender o saber, de ser capaz de o explicar, de o abrir, de ver olhos a deixá-lo entrar e bocas novas a dizê-lo, a acrescentá-lo. Pois é, fiquei sete anos, como o pastor do soneto, a aprender, a aprender saberes que se multiplicavam, se ramificavam. É assim que os troncos crescem. Crescer também é isto: aprender.

Multiplicavam-se as folhas, as dos livros, as dos sinais de futuro... E não demorei nem o tempo de uma pergunta para saber que pelas Letras é que eu iria. E fui. Coimbra. Nesse tempo em que muita coisa estava errada, as universidades eram poucas, destinadas a pouca gente. Coimbra foi a terra do meu estudo das Letras Clássicas, da minha descoberta e aprofundamento do génio de gregos e romanos, de preciosidades antiquíssimas a abrirem para horizontes cheios de modernidade. E, quando chegou o momento de confrontar a vontade de ser professora com a realidade, escolhi Lisboa.

Corre o ano de 1971 e, nesse tempo em que quase tudo continuava a estar errado, num mês de outono, pela primeira vez vou entrar numa sala de aula e ver de que cor é, afinal, a flor da alegria de ensinar.

Um vice-reitor apressado e desinteressado passou-me para a mão um pedaço de cartolina esverdeada em que se desenhavam algumas quadrículas preenchidas com alguns números (era o meu horário), olhou de soslaio para o relógio de pulso, e disse: «— Está quase a tocar, tem agora uma aula, vá!» E eu fui. Eu e todas as inseguranças deste mundo e do outro. Mas, como nas epopeias antigas, não Atena, mas a que fora a minha inesquecível professora de Português durante cinco anos caminhou, invisível, a meu lado. Foi ela o meu modelo para esse primeiro ano de mergulho sem rede na profissão de professora, num tempo em que muitíssima coisa estava errada. E talvez tenha sido, esse ano inaugural, o mais rico em aprendizagens do meu ser-professora. Dando a máxima atenção ao retorno que vinha dos alunos, refletindo sobre cada passo que dava, fui transformando inseguranças em saberes. Comecei a aprender... a estar, a fazer, a dizer, a ouvir, a calar, a começar, a terminar, a retomar, a esquecer, a lembrar, enfim, a dominar  a arte de estabelecer com os alunos, com cada aluno, uma aliança produtiva. Aquela, e só ela, que permite uma passagem autêntica do conhecimento. O reconhecimento mútuo de quem ensina em quem aprende e de quem aprende em quem ensina. Nessa primeira escola, secção do Liceu D. João de Castro, em Almada, fiquei apenas um ano. Os oito seguintes foram vividos no Liceu Nacional da Amadora e atravessados por factos e desafios fortalecedores das convicções profissionais que fora firmando.

Lembrança viva essa, por exemplo, a que me ficou da diferença entre, num dia, ler com os alunos Gil Vicente antes do 25 de abril e, noutro logo a seguir, ler Gil Vicente com os alunos depois do 25 de abril. A leitura precisa de liberdade, precisa de perguntas livres, precisa de leitores plurais, precisa de debate. Libertar a leitura e o conhecimento de qualquer reserva, de qualquer espécie de medo, foi talvez uma das consequências do 25 de abril, cuja lembrança, como professora, guardo mais viva!

Foi este um tempo em que a escola abanou em todas as suas dimensões e não foi fácil mantê-la de pé. Por volta de 1978 — depois de alguma resistência fundada na convicção de que o que mais me interessava era ensinar — aceitei o lugar de vice-presidente do conselho diretivo. Foi um ano de sol a sol no liceu, a colaborar na sua reconstrução institucional, cultural, material, humana. Nesta escola, fiquei oito anos. Depois, parti para aquela onde ensinei até à hora de me vir embora: a Escola Secundária de Benfica, que, mais tarde, passou a chamar-se Escola Secundária José Gomes Ferreira. Foi aí que, durante vinte e oito anos, fui trabalhando numa aproximação, cada vez maior, às condições que considero essenciais à eficácia do ensino: as que permitem uma relação individualizada com cada aluno, através do conhecimento muito próximo das suas caraterísticas e do seu carácter de aluno. Aí, foi-me possível a permanência com os mesmos alunos ao longo dos seus anos de escolaridade e o trabalho com turmas construídas dentro de uma escala racional. Estas, duas das condições que permitem “fazer” alunos, porque os alunos não se escolhem, “fazem-se”.  A dedicação ao ensino de disciplinas como a Literatura Portuguesa (Português A) e o Latim permitiam-no. Foram quase trinta anos a fazer, a ver, a sentir, com nitidez e certeza, a tal coisa que me tinha fascinado no meu primeiríssimo dia de aulas, lá longe na Escola de São Miguel: o saber a passar de uma pessoa para outra. Na minha vida de professora, esta foi sempre a coisa mais importante. A tal flor era da cor da alegria de ensinar e da curiosidade de aprender. Em volta, progressivamente, iam caindo sombras, muitas sombras, cada vez mais espessas. Sombras que apagaram o Latim, sombras que fizeram mirrar os autores clássicos, sombras que confundiram cada aluno em turmas sem fim... Então, senti-me obrigada a preservar, para memória futura, a alegria de ser professora. A guardá-la numa lembrança luminosa, enternecida, como, por exemplo, meus alunos, esta da partilha da escrita e das leituras: a de vos olhar, ali, à minha frente, os olhos baixos sobre essa coisa antiga, o papel, tentando arrancar palavras de algum lugar dentro de vós, para esta coisa difícil, morosa, trabalhosa, a escrita! E também esta, meus alunos, a da minha persistência, essa minha teimosia, esse meu labor de vos agricultar a escrita, como no poema do Torga: «Meu pai a erguer uma videira/como uma mãe que faz a trança à filha.»

Por isso, antes que fosse o tempo administrativamente determinado, saí. Sei que ficaram frutos.

[JL, 23 de julho, 2014]

Autoria e outros dados (tags, etc)

por Maria Almira Soares às 23:17

Terça-feira, 29.07.14

VENTURA E QUEIJETAS

 

Chamo aqui, na sua qualidade de representação ficcional de um saber experiencial, estas linhas do Cântico Final, romance de Vergílio Ferreira:

 

«Abri o livro, li: “sonho que sou um cavaleiro andante”, […] Peguei no soneto e li-o. Perguntei-lhe: entendeste? “Entendi, sim, senhor”. “Então explica lá”. “Bem, - disse ele. Isso é assim como se eu visse uma casa rica e dissesse comigo: vai lá, João, vai lá que ali há de haver pão, chouriço, vinho e queijetas. E depois eu vou lá - e nicles: não há lá nada.”»

 

 O que aqui Vergílio Ferreira ficcionalmente representa é um ato de leitura bem demonstrativo da desigualdade matricial da cultura leitora do professor e do aluno, impossível de ser apagada por qualquer preceito pedagógico de aproximação alisadora. Sem a presença deste desequilíbrio na matriz relacional, não há condições de efetiva educabilidade. Se o atrito entre o que vai subsumido no «entendeste?» do professore o «chouriço»e as«queijetas» da leitura genuína do aluno, for apagado, também não poderá ser transcendido, uma vez que, no jogo didático que é a verdade da aula, deixa de existir. A tendência pedagógica para a promoção deste apagamento atua perversamente e retira, ao aluno, condições de ser conduzido para uma outra cultura leitora que o professor lhe abriria como possível, desejável e até apetecível.

Autoria e outros dados (tags, etc)

por Maria Almira Soares às 12:44

Segunda-feira, 28.07.14

EDUCAÇÃO & LEITURA: O OVO DE COLOMBO?

 

 

Luiz Philippe

 

É o significado profundo desta conexão entre educação e leitura e das condições da sua praticabilidade que questiono, pondo em causa a aceitação da evidência de uma relação imediatamente harmónica ou desarmónica das suas partes. Em meu entender, tal aceitação, ora forçando a liberalização da escola, ora forçando a instrumentalização da leitura, tem participado na detração da natureza quer de uma quer de outra e, ainda assim, sem grande produtividade. O significado com que uso aqui o termo educação é fiel à sua etimologia, aquele que George Steiner subscreve quando afirma: «Educar» significa «fazer avançar» e, paradoxalmente, fiel também ao sentido de restrição implícito na voz daquela personagem de Vergílio Ferreira que, no seu modo ficcional, misto de efabulação e debate de ideias, diz: «Toda a educação é uma violência». Desinteresso-me da hipótese de leitura e educação serem meros processos paralelos, cujo espaço interativo seria um lugar cego, habitado por simultaneidades proféticas, o que, deste modo e nos próprios termos, impossibilitaria a análise da relação que procuro compreender. Desinteresso-me da hipótese da dupla e reversível metaforização que toma ler como educar e figura, no educar, uma aplicação do ler, porque a razão de ser desta conexão se situa principalmente no plano nominal do jogo retórico, acumulando espessura verbal sobre um pensamento que se exige clarificador. Assim, passo, liminarmente, ao interesse pelo debate sobre se, no ato escolar de educar leitores, educação e leitura são práticas harmonicamente conjugáveis, em ambiente de homogenia, ou se a significação do mútuo efeito de atrito, gerado na educação escolar do leitor, reclama uma chave interpretativa da ordem do paradoxo. É esta a questão que coloco como primeira entrada num percurso de clarificação do conceito de educabilidade escolar do leitor. Esta abordagem problematizadora da conexão entre educação e leitura (na sua vertente: educa-se a leitura?) é, nos relatos de experiência frequentemente produzidos, invertida e ocultada, em prol da aceitação de uma suposta evidência testemunhal: a da harmonia implicada nos aparentes resultados educacionais positivos da leitura. Deste modo, a bondade educativa da leitura (presumida a partir do reconhecimento cego dos seus resultados e, a partir deles, generalizada) e, bem assim, a forçosa harmonia aí implicada, abatem a complexidade do problema até à superficialidade demonstrativa de um ovo de Colombo. A colocação de todo o horizonte de interesse do lado do efeito prejudica oportunidades de reflexão sobre a natureza e condições da educabilidade do leitor. O ah! conclusivo e aprovador absorve a questionação do processo, como se este fosse também evidente e participasse da energia benéfica do seu resultado. Educar e ler euforicamente homogéneos?! Partindo da hipótese de que o elo relacional entre educação e leitura não se estabelece por virtude de uma espontânea reação harmónica, quebro o aparente círculo virtuoso da leitura que educa e é educável. Trata-se do passo inicial para a compreensão da complexidade relacional entre educação e leitura e, daí, para a dilucidação do factor capaz de respeitar e transcender o seu diferendo natural, transformando-o em coerência educativa. Evidenciar este factor será estabelecer um campo de trabalho metódico sobre a educação escolar do leitor, em vez de a deixar ao sabor de dinâmicas caprichosas e resultados episódicos que, por sua vez, caucionam preceitos, doutrinações e práticas equívocas. A fácil demonstração de uma verdade através do testemunho de práticas que aparentam ser a sua própria evidência sobretudo neste caso da educação escolar do leitor, em que a análise reflexiva detecta, nas práticas, largos défices de coerência ofusca a sua compreensão, ocultando factores e dimensões que lhe são essenciais. A reflexão sobre a anedota do ovo de Colombo descobre a posteriori que a aparente facilidade do gesto para a verticalidade foi, afinal, a inédita ousadia de legitimar o atrito sobre um fechamento perfeito cujo potencial de verticalidade seria, na ausência de tal gesto, tão-só o de girar em torno de si próprio. Se retomo o simbolismo desta história é porque lhe atribuo uma significação congruente com a linha de pensamento em que me coloco: a da convicção de que, em educação, preterir a concordância com um estado de assumida perfeição natural é condição para atingir um nível superior de realização: a perda é transcendida pelo valor que permite atingir. Ou, visto de outro ângulo, nas reiteradas palavras de Vergílio Ferreira: «Toda a educação é uma violência». Tomo-o, também, como metafórico aviso de que, em educação, o evidentemente fácil é o difícil transformado em aparentemente fácil por quem, para tal, tem o saber.

Autoria e outros dados (tags, etc)

por Maria Almira Soares às 22:20

Quinta-feira, 24.07.14

AUTORRETRATO

Autoria e outros dados (tags, etc)

por Maria Almira Soares às 22:57

Segunda-feira, 07.07.14

O SÃO CARLOS NO TEMPO D'OS MAIAS

 

A condessa voltara-se para a plateia, coberta com o leque, com o ar constrangido, como se aquelas palavras pueris do marido a diminuíssem, a desfeassem... Carlos então falou da ópera. Que belo escudeiro huguenote fazia o Pandoli! A condessa não aturava o Corceli, o tenor, com as suas notas ásperas e aquela obesidade que o tornava bufo. Mas também (lembrava Carlos) onde havia hoje tenores? Passara essa grande raça dos Marios, homens de beleza, de inspiração, realizando os grandes tipos líricos. Nicolini era já uma degeneração... Isto fez lembrar a Pati. A condessa adorava-a, e a sua graça de fada, e a sua voz semelhante a uma chuva de ouro!... Os olhos brilhavam-lhe, diziam mil coisas; em certos movimentos, o cabelo crespamente ondeado, tomava tons de oiro vermelho: e em torno dela errava, no calor do gás e da enchente, um aroma exagerado de verbena. Estava de preto, com uma gargantilha de rendas negras, à Valois, afogando-lhe o pescoço onde pousavam duas rosas escarlates. E toda a sua pessoa tinha um arzinho de provocação e de ataque. De pé, calado, grave, o conde batia a coxa com a claque fechada.

O quarto acto começara, Carlos ergueu-se; e os seus olhos encontraram defronte, na frisa do Cohen, o Ega, de binóculo, observando-o, mirando a condessa e falando a Rachel, que sorria, movia o leque com um ar dolente e vago.

- Nós recebemos às terças-feiras, disse a condessa a Carlos - e o resto da frase perdeu-se num murmúrio e num sorriso. O conde acompanhou-o fora, ao corredor.

- É sempre uma honra para mim, dizia ele caminhando ao lado de Carlos, fazer o conhecimento das pessoas que valem alguma coisa neste país... V. Ex.ª é desse número, bem raro infelizmente. Carlos protestou, risonho. E o outro, na sua voz lenta e rotunda:

- Não o lisonjeio. Eu nunca lisonjeio... Mas a V. Ex.ª podem-se dizer estas coisas, porque pertence à elite: a desgraça de Portugal é a falta de gente. Isto é um país sem pessoal. Quer-se um bispo? Não há um bispo. Quer-se um economista? Não há um economista. Tudo assim! Veja V. Ex.ª mesmo nas profissões subalternas. Quer-se um bom estofador? Não há um bom estofador... Um cheio de instrumentos e vozes, dum tom sublime, passando pela porta da frisa entreaberta, cortou-lhe umas últimas palavras sobre a deficiência dos fotógrafos... Escutou, com a mão no ar:

- É o coro dos punhais, não? Ah vamos a ouvir... Ouve-se sempre isto com proveito. Há filosofia nesta música... É pena que lembre tão vivamente os tempos da intolerância religiosa, mas há ali incontestavelmente filosofia!

 

Autoria e outros dados (tags, etc)

por Maria Almira Soares às 21:12

Segunda-feira, 07.07.14

MUITO FALADOS, POUCO LIDOS

A LERDOCELER encerrou o seu ciclo de leituras deste ano, cujo tema era Portugal, com o debate de leituras de PORTUGAL AMORDAÇADO de Mário Soares. Foi um debate muito vivo: desde a passada mordaça salazarenta até à presente intoxicação verbal que não se aguenta, avivou-se a discussão sobre o sentido fundamental deste livro, sobre o valor e a importância da intervenção cidadã. 

Novo ciclo vai iniciar-se em Setembro sob o lema: MUITO FALADOS, POUCO LIDOS

Ler-se-ão livros a que muitas vezes nos referimos e até citamos, sem deles termos feito a leitura completa... Livros que muitas vezes conhecemos de ouvir falar ou até do cinema, mas ainda não lemos... Livros cuja leitura, por uma razão ou por outra, se ainda a não fizemos, gostaríamos de ter feito:

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Autoria e outros dados (tags, etc)

por Maria Almira Soares às 17:32

Pág. 1/2



Mais sobre mim

foto do autor


Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Pesquisar

Pesquisar no Blog  

calendário

Julho 2014

D S T Q Q S S
12345
6789101112
13141516171819
20212223242526
2728293031