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"Tal como surgiu diante dos meus olhos, a esta hora meridiana, fez-me a impressão de uma alegre oficina da sabedoria." (Umberto Eco, O Nome da Rosa)
Lembro agora como, a uma antiga de vós, lhe saltaram as lágrimas aos olhos, quando lhe disse firmemente: não. Nunca lho tinham dito assim. Mas eu, meus alunos, eu não me conformo. Continuo a querer lógica, raciocínio, racionalidade. E vós… vós resistis, parais, tentais desistir. Pois é, bem sabeis que tenho de fazer essa coisa fora de moda (dizem até que arriscada) de vos obrigar. Essa coisa que já quase ninguém vos faz. Sinto, sei que é minha obrigação obrigar-vos. E vós, enfim, perante a minha força do mais forte, lá ides indo, lá ides tentando, lá ides conseguindo. Muitas vezes vos digo que, de mim, só podereis ter a verdade, mesmo que ela vos doa, mesmo que ela me doa. E é por causa disto, por causa da verdade, que tenho de vos dizer — e vós bem o sabeis — que não é bem assim, que não é apenas uma questão da força do mais forte, não. É também uma questão de serdes apanhados de surpresa por uma firmeza despudorada, impositiva, para a qual não tendes resposta preparada e que vos retira toda a guarda perante o que vos digo que façais. E uma vez que o fazeis uma vez… Uma vez que, uma vez, vos deixais obrigar a fazer o que vos digo que façais, já não há recuo possível. Sabeis, tão bem como eu, — andamos nisto, eu e vós, há tempo suficiente para que o saibamos — que as aulas têm as suas coisas, próprias, que não há em mais lugar algum. Sabeis bem, por exemplo, que se “o professor deixa” uma vez, nunca mais consegue verdadeiramente deixar de “deixar”. E que convosco é o mesmo: se desprevenidamente fazeis o que vos mando, mesmo que o que vos mando, à primeira vista, vos pareça quase impossível, ficais como que incapazes de não-fazer o que vos mando. E a tontura da surpresa, meus alunos, o espanto da surpresa, traz consigo a atração pelo desconhecido que é uma coisa muito juvenil. Muitos não o percebem, mas é precisamente essa coisa juvenil da atração pelo desconhecido que vos leva a aceitar o poder de uma voz firme e peremptória, insólita neste mundo escolar em que procuram falar-vos com doçura e como se vos pedissem desculpa por terem de ser vossos professores. Eu não. Eu, como bem sabeis, não tenho nenhum pudor em ser vossa professora. Sou afirmativa sem justificação e a surpresa que, de princípio, isto põe no vosso olhar nada me incomoda, pois sei que, deferidamente, depois do sobressalto da novidade, vós ides regressar à tranquila verdade de ser aluno.
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