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"Tal como surgiu diante dos meus olhos, a esta hora meridiana, fez-me a impressão de uma alegre oficina da sabedoria." (Umberto Eco, O Nome da Rosa)
A história da língua é uma história de traições, uma memória incorporada de deslealdades. À semelhança do que o filósofo antigo disse da água do rio, a lealdade à língua que passou por nós no preciso momento em que lá estávamos, que era o nosso momento, é, em verdade, uma deslealdade para com a língua que julgávamos estar a aceitar como de antemão fixada. Perdem-se, nas margens do tempo, as vozes, os rostos, os olhos, as mãos, as canetas, as teclas, que instalaram comportas, levantaram remoinhos, interpuseram barragens, regularizaram leitos e caudais, desviaram linhas de água, cortaram rumorejos, roubaram transparências, ramificaram correntes e contracorrentes no grande e largo e fundo e volumoso rio que é uma língua. E, enquanto isso, ela, a língua, ri-se palimpsesticamente, ri-se queirosianamente, ri-se filosoficamente.
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