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"Tal como surgiu diante dos meus olhos, a esta hora meridiana, fez-me a impressão de uma alegre oficina da sabedoria." (Umberto Eco, O Nome da Rosa)
A educação — que se faz por momentos sucessivos de aprendizagem — para ser efetiva, vai sendo sempre uma coisa de resultado em parte diferido, de resultado não cabalmente imediato; em cada momento, deixa sempre em aberto algo de ainda não-aprendido que aponta para o futuro e é isto que a torna perdurável. Em todas as áreas e na área da leitura também. Não será perdurável, se, em cada etapa da sua prossecução, a fecharmos numa satisfação cabal; será uma coisa acabada em si mesma sem fermento de futuro. Para ser perdurável, há de deixar em aberto uma margem de insatisfação. Em educação, a sensação/ experimentação/memória de que sobrou alguma coisa de que ainda não sou capaz é preciosa para o desenvolvimento futuro. Esta sensação de dificuldade não significa rejeição, mas promessa e desafio. Assim, também, no que diz respeito à educação do leitor.
Ou seja, em palavras mais simples, se, cheios de boas intenções de obtermos sucesso imediato, fizermos com que a leitura seja, perante as crianças, apenas aquilo de que elas imediatamente gostam, aquilo que se integra, sem diferença nem atrito, no seu natural mundo sensitivo de criança, teremos o sucesso imediato garantido. Elas vão gostar. Elas vão querer. Mas... Serão esse gosto, essa vontade, perduráveis? Eu sei que, com estas implicativas dúvidas, em tudo pareço ir contra a corrente. Mas não, eu vou é contra os equívocos. Espero não aparentar que estou contra a ideia de que a leitura começa na infância e que, aí, se deve apostar. Não, de modo nenhum. Como disse atrás, é, em criança, que tudo começa e a leitura também. Aí tudo começa e eu preocupo-me com que comece bem para que continue bem.
Preocupa-me verificar a existência de casos, talvez muitos casos, em que infâncias conquistadas para a leitura dão em adolescências de abandono brusco ou progressivo e em juventudes que desembocam na aridez de vidas adultas que não leem nem um livro por ano. Entristece-me verificar, durante encontros que tenho tido com jovens, em escolas, a complacência, a aceitação de braços caídos de inevitabilidade, perante a realidade de muitos e muitos, quase todos, desses que foram crianças leitoras muito animadas senão entusiasmadas com a leitura, se revelarem quase fisiologicamente incapazes de ler Os Maias. Ler foi para eles apenas uma coisa da infância. Crescer foi, neles, deixar as coisas da infância, esses livros, lindos, em que quase tudo era desenho, coisas que ficaram na infância como objetos nostálgicos e de que se lembram com um sorriso, como doutros brinquedos que tiveram, e que, para eles, nada têm a ver com a vontade, a curiosidade, de ler um livro como... Os Maias. E que leitores triunfantes eles foram na infância! Os triunfos imediatos esgotam-se em si mesmos.
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